O mantra cantado por Tina Turner, a caminho da hemodiálise, acalma a minha mente.
Minha cabeça fica em ebulição quando vai chegando a hora de ser ligada à terapia renal substitutiva. Uma rotina que prolonga a minha vida, mas, ao mesmo tempo, me incomoda, porque limita a minha liberdade.
Tenho encontro com a máquina segunda, quarta e sexta, uma média de 10 horas por semana ou 40 horas por mês.
E quanto mais me aprofundo no mundo da hemodiálise, fazendo minhas pesquisas na internet e trocando ideias com os pacientes, mais confusa eu fico.
Desperta em mim sentimentos ambíguos e a consciência da dependência da tecnologia e da convivência com minhas limitações.
Como não tenho outra opção, me entrego ao meu tempo presente. Ė o que temos para hoje.
E hoje vim mais paramentada para a sessão. Uma luva aquece minhas mãos e tem até uma película própria para digitar.
A cabeleireira Maria, de 59 anos, usa até cachecol depois de sair de uma pneumonia e de uma tosse, que era ouvida em todo o ambiente.
Ela faz hemodiálise há 8 anos e não tem a mínima intenção de entrar na fila do transplante. Diz que ouviu a ” voz do coração ” e prefere continuar a dura rotina com todos os sintomas provocados durante o processo. Não se importa com os efeitos colaterais, que começam no momento da punção das agulhas.
Perdeu os rins por causa do diabetes, doença que descobriu tardiamente. Não fazia exames e vivia para o trabalho. Munida de informações sobre transplantes que não deram certo, optou por essa vida “até quando Deus quiser”.