Também tem bingo na hemodiálise

– Põe a mão no saco meu amor! Quem quer colocar a mão o saco?

– Eu, diz o residente ao entrar no box. Ele tira 2 pedras do saco.

– Deu aqui! Deu linha pro seo Sebastião.

– Ele não comeu bronha dessa vez.

– Vamos lá! Quem tá na boa?

– 44, as primas, e 24 pra combinar com as primas (rs)

Nunca joguei tanto bingo na minha vida. E não é que o tempo passa mais rápido na hemodiálise? E às vezes até ganho os presentinhos, como já relatei.

– Agora a última linha.

– Deu aqui – grita Israel, que ganhou uma prenda pela primeira vez.

Israel, 65 anos, começou a dialisar há menos de um mês. Sabe há quanto tempo ele espera por esse momento? Nada menos que 6 anos.

Quando passou mal e as taxas da função renal começaram a subir, a primeira coisa que o médico pediu foi a fístula.

Ficou os últimos anos à sombra da hemodiálise e não deixou de trabalhar carregando caixas de frutas. Uma sorte a fístula ter durado até agora, quando precisou ir realmente para a máquina.

Quem me contou a história dele foi sua mulher, que fica 4 horas na recepção esperando, porque o marido se sente mais seguro com ela por perto.

Mas hoje eu quero mesmo é falar sobre a Hercília, a animadora do bingo.

A loira de olhos claros, 65 anos, faz esse trabalho voluntário há 3 anos aqui na clínica.
Durante muitos anos ela morou em Rio Preto e animava o serviço de hemodiálise de um hospital.

Ao voltar a viver em Ribeirão, conheceu a mulher de um dos donos da clínica e conseguiu autorização para continuar esse trabalho.

O que leva uma pessoa a se dedicar a esse tipo de voluntariado? Hercília resume em uma única palavra: “emoção”.

Ela diz que fazer o bem preenche a vida e nada tira a emoção de ver as pessoas se divertindo em um momento tão duro. A ideia dela é ampliar o bingo para os outros horários das sessões. E para isso precisa de mais gente ajudando. Hoje ela tem duas colaboradoras que circulam pelos boxes cantando os números e distribuindo as prendas.

Hercilia contagia o ambiente com simpatia e suavidade. E nos faz acreditar que os anjos realmente existem.