Treino para o novo rim

Foto da nova meia para aquecer meus pés; presente de Renata Guimarães

Ele chega de uma hora para outra sem avisar, não importa onde você está e nem o que está fazendo naquele momento. Simplesmente chega e faz seu chão desabar. Sentimento de alegria se mistura com o do medo. Uma sensação inimaginável em minha vida até ontem.

Foi assim que chegou um rim compatível para mim nesta terça-feira pós-aniversário, que comemorei com muito rock.

O celular tocou no meio da edição de uma matéria que ia abrir o jornal. Relutei em atender porque estava concentrada no trabalho, mas num impulso dei o alô e do outro lado uma médica me perguntou se eu havia feito transfusão de sangue nos últimos meses. Assim que eu respondi a médica me informou que tinha um rim para mim.

Fiquei sem ação, sem saber o que fazer. Só sei que tinha que dar a resposta em 15 minutos se aceitava aquele presente de uma pessoa de 44 anos que sofreu um acidente de carro e teve morte cerebral.

Avisei meu marido e ele desabou a chorar de emoção. E agora?


Fiquei sem ação, sem saber o que fazer. Só
sei que tinha que dar a resposta em 15 minutos


Abandonei tudo o que estava fazendo para ir ao nefrologista que acompanha meu caso. Existia uma informação me pertubando e não senti no meu coração que aquele rim era meu.

E não era mesmo. Eu e o médico decidimos recusar porque não era um bom rim.

O doador era ex-usuário de droga, tinha o corpo todo tatuado e já havia tido hepatite. Para pacientes que aguardam há mais tempo pelo transplante e que enfrentam problemas com fístulas ou estão enfraquecidos pela hemodiálise, talvez esse rim fosse a melhor opção.

Mas o médico avaliou que eu podia esperar por um rim de uma pessoa mais saudável já que estou bem adaptada à hemodiálise.

Quando o rim é compatível, mas o doador tem uma história como essa, podem surgir complicações que se tornam uma outra luta no pós-transplante. Melhor não arriscar.

“Foi um treino”, disse um amigo médico que encontrei por acaso, depois desse furacão. Ele próprio doou um dos rins para uma irmã, que vive com o novo orgão há 17 anos.

Considerei esse fato inusitado em minha vida como uma preparação para quando o rim definitivo chegar.

Até lá, quem sabe eu já tenha definido o hospital em que quero fazer o transplante e esteja melhor informada sobre o procedimento?

Mas que foi um dia muito louco, de muita emoção, ah isso foi!